terça-feira, 30 de abril de 2013


Uma Joia a ser lapidada

Tenho insistido em realçar a importância da produção como um pilar incorporado à mística do fazer cineclubista do século XXI, mas tenho dito também, que o olhar sobre o fazer desta produção, tem deixado em muito a desejar. Salvo as exceções de sempre, anda difícil saber o que é pior, os vídeos de casamento ou os de, e, sobre os cineclubes.

Acabo de vir do lançamento do vídeo “Cineclube Mazzaropi, Cultura na Periferia”, no Cineclube Jorge Batista de Osasco, que realiza o projeto “Cine-Debate”. 0 vídeo é um documentário que resgata a história daquele grupo de jovens cineclubista, o que aconteceu com cada um deles, com a evolução da comunidade e o processo de retomada do cineclube.



O vídeo todo construído com imagens, entrevistas da época, 1984 a 1990, permeado com as atuais. Contextualiza e incorpora a atividade cineclubista, nas lutas, anseios e sonhos da comunidade do Jardim Novo Osasco, Conceição e Olaria do Nino, procurando saber o que aconteceu com cada um dos seus participantes e quais as conseqüências depois da participação no trabalho do cineclube, que não se resumia somente ao fazer cineclubista em si, mas interagindo com outras linguagens artísticas; principalmente música, teatro, dança e os primeiros movimentos do Hip-Hop e movimentos de rua.

Deste ponto de vista, da formação do homem enquanto sujeito, ativo, crítico e participativo, o vídeo em essência, demonstra na prática a importância desta atividade. Os depoimentos registram o que aconteceu com cada um deles. Todos estão bem colocados, lutando por manter suas conquistas, tanto no trabalho empresarial ou mesmo na afirmação com a atividade profissional que resolveu seguir. Há o depoimento marcante de um dos participantes do cineclube que diz algo mais ou menos assim: “Se não fosse pelo Orlando que me trouxe para o grupo de jovens dos cineclubes, com certeza eu teria caído no mundo das drogas, eu já estava no caminho”. Hoje ele tem uma micro-empresa de eventos e tanto ele com sua filha estão dispostos a colaborar com a volta do cineclube Mazzaropi a ativa.

Evidente que o registro feito há mais de vinte anos, em VHS, apresenta as deficiências do sistema de captação de imagens, mas do significado memorial e histórico, é um destes trabalhos que deve ser difundido, não só pelos cineclubes, mas pelas Escolas, Pontos de Cultura, Mostras e Festivais.

O vídeo enquanto narrativa tem momentos primorosos, principalmente quando mostra num plano geral, uma espécie de Assembléia popular, sobre a questão da moradia e da desocupação de uma área invadida, em seguida, um corte seco, para o mesmo bairro com ruas asfaltadas e continuação da luta por melhores condições de vida a ser conquista palmo a palmo e sempre com muita disciplina, base fundamental da luta revolucionária que o povo trava no dia-a-dia. È como se o vídeo quis dizer: È preciso estar atento, permanentemente pronto para uma nova batalha.



Por outro lado e mesmo ressalvando as condições técnicas, pela riqueza do conteúdo e a disposição do Diretor Orlando Silva, em ouvir sugestões, apresentando o vídeo como uma obra em aberto, acatando novas idéias, seria importante, alguns ajustes técnicos, mas essencialmente o vídeo está pronto, com a espinhal dorsal bem delineada e de conteúdo primoroso. Fica aqui, o que já conversamos no debate, junto com o público. O vídeo é um produto de formação e informação, que traz consigo a memória coletiva de um grupo de jovens, que ousaram fazer um trabalho de arte e cultura, na periferia de uma cidade de grande vulto urbano, centro do chamado “Novo Sindicalismo” nos anos de 1960 e início dos 70, de onde saíram José Campos Barreto e o Capitão Carlos Lamarca, tendo uma gama memorável de lutadores da liberdade, invejável, que citá-los, a lista seria imensa, para um texto despretensioso, mas fica nossa homenagem.

Retomando, quando alguém se pré-dispõe a fazer um vídeo como este, onde o diretor é está emocionalmente envolvido e onde ele, Orlando Silva, faz um pouco de tudo, precisa fazer o distanciamento crítico e cortar, cortar principalmente os amigos. O Vídeo é um recorte de um determinado assunto, que necessita clareza, síntese, ritmo para que a história tenha fluidez narrativa, para que o público possa acompanhar o desenrolar dos fatos e de preferência de forma alegre, sem complicações. A simplicidade pode ser o caminho mais curto para se alcançar a perfeição.

O vídeo do Orlando está como um bom carro em auto-estrada, que vai andando em zin-zag. É só para no próximo posto, calibrar os pneus e seguir viagem...



Diogo Gomes dos Santos
Cineclubistas

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