terça-feira, 24 de abril de 2012

O DIA EM QUE OLHAMOS PARA O CÉU


Amigos,

Começou hoje – 19.04.2012 - na Caixa Econômica Federal, praça da Sé, São Paulo a Mostra: “CINEMA PÓSIUGOSLAVO”, que reúne filmes de seis cineastas que buscaram retratar a diversidade estética do cinema feito na Península Balcânica.

“Seis repúblicas entrelaçadas por línguas, religiões e culturas distintas. A proximidade era apenas geográfica e o anseio por independência ecoava entre os povos. O resultado não poderia ter sido outro: em 1991, a Iugoslávia passou por sua dissolução. Eslovênia e Croácia emergiram da névoa que cobria os conflitos internos entre nações e fincaram na terra suas bandeiras de independência”.

“Após tais rupturas, seis cineastas decidiram transportar sua visão sobre os acontecimentos que reestruturaram a Península Balcânica. Aos que têm interesse em conhecer a diversidade estética dos trabalhos desenvolvidos no início dos anos 1990, reservem mais do que um dia para a mostra CINEMA PÓS-IUGOSLAVO. De 19 a 29 de abril, na Caixa Cultural Sé exibe 36 sessões de filmes, com entrada gratuita”.

“Além das exibições, a programação também traz um mini-curso com presença de Francis Vogner dos Reis (crítico de cinema), Zoran Djordjevic (cineasta Sérvio) e Andrea Schvartz Peres (especialista em história da Iugoslávia). As inscrições podem ser feitas pelo link: www.cinemaposiuguslavo.com.” (texto da divulgação).
Entre estes filmes tem o curta: O DIA EM QUE OLHAMOS PARA O CÉU/1997, dirigido pelo cineasta Sérvio Zoran Djorjevic, produzido em São José dos Campos, pelo Núcleo de Estudos de Cinema & Vídeo Ethos, que criei. Também produzi, atuei, puxei cabos, varri o chão... Apesar de não ser oficial, talvez o filme seja a única Co-Produção Brasil/Iugoslávia. Como foi um filme feito pela nossa vontade, o processo de realização deste filme, é uma epopéia. Escrevi umas linhas sobre isso, se for possível, agradeço imensamente a divulgação.






Por trás das câmeras de 
O DIA EM QUE OLHAMOS PARA O CÉU, 
Uma quase Epopéia Cinematográfica.

Em 1995, depois de uma Oficina Básica de Cinema e Vídeo, realizada pela Fundação Cultural Cassiano Ricardo de São José dos Campos, ministrada por mim, criamos o “Núcleo de Estudos, Produção e Difusão de Cinema e Vídeo ETHOS”.  O Ethos foi o resultado de esforços para se criar na cidade, através do processo cultural, um espaço do desejo, onde o mais importante era à vontade coletivamente de produzir sonhos, contar história por meio das imagens em movimento. A cidade sob administração do Partido dos Trabalhadores – PT - acabara de aprovar, a Lei Municipal de Incentivo Fiscal à cultura.

Chegou à cidade, fugindo da guerra, um cineasta Iugoslavo, Zoran Djorjevic, que mal balbuciava uma ou outra palavra em português, vindo de São Paulo, que junto com Daniel Vilela e Luiz Montes, tentavam rodar um filme, via Lei de Incentivo.

Depois de conversarmos, Zoran começou a frequentar o Núcleo Ethos, aos poucos foi se integrando com os demais participantes e logo ficou amigo de todos e estava sempre preocupado, não só com a guerra em sue país, mas também com a vinda de um amigo para o Brasil, o Diretor de Fotografia Vladan Obradovic, que ele havia convidado para rodarem o filme juntos em São José dos Campos.

Além do Núcleo Ethos, eu produzia alguns filmes e convidei o Zoran para dirigir um filme institucional, que era para ser documentário, mas que fizemos ficção, sobre o período de férias escolar da cidade. O filme significou um avanço, para uma cidade do interior, financiar um filme que seria corriqueiro, mas que se transformou numa peça de vanguarda.

Com a chegada do Valdan, chegou também à confirmação da inviabilidade da produção com o Luiz e o Daniel. Nesta altura o Núcleo estava em fraco processo de produção e resolvemos trazer a produção do filme para o Núcleo. Estabelecemos algumas parcerias, principalmente com a ECA/USP, conseguimos uma câmera 16 mm blindada, motor de velocidade variável, equipamentos de som e dois técnicos que acompanhavam os equipamentos. Terminamos de rodar o filme, sem colocar um tostão, mas utilizando-se da estrutura da Fundação Cultural Cassiano Ricardo, mantenedora do Núcleo. Zoran e Vladan ficaram hospedados em minha casa e o Zoran, uma vez por semana, descia até Caraguatatuba, para visitar sua mulher “Zélica”. Dias difíceis aqueles.

Terminado de rodar o filme, Zoran é obrigado, por questões familiares a voltar com sua esposa para a Iugoslávia, que já estava em processo de desagregação, em guerra novamente, agora na eminência de um confronto bélico com os Estados Unidos, via OTAN – Organização do Tratado do Atlântico Norte.
Em Belgrado, Zoran refaz suas relações profissionais e estabelece parcerias para finalizar o filme. Concretiza-se assim, uma Co-Produção Brasil/Iugoslávia, sem os tramites oficiais para sua realização. Finalizado o filme ganha o festival de Belgrado e Zoran o de melhor diretor.

No Brasil, precisávamos da cópia para a prestação de contas e colocarmos o filme nos circuitos de Festivais, Mostras e distribuição, mas, eis que o confronto militar com a OTAN se anuncia breve. Zoran, não podendo voltar ao Brasil, sua esposa com gravidez adiantada, Vladan fora trabalhar para a BBC, um bom emprego, mas naquele momento para os Iugoslavos do lado do inimigo. Zoran fumando dois maços de cigarros por dia, prestes a explodir o sistema nervoso, a OTAN marca hora para bombardear Belgrado, a “navigation” preparada para a primeira transmissão de uma guerra ao vivo.

Zoran por medida de segurança, depositar cópia e negativo do filme no prédio velho da Cinemateca de Belgrado, ao lado do prédio novo construído para abrigar também a sede da TV Estatal.  A OTAN bombardeia, destrói o prédio novo que abrigava parte da Cinemateca e toda a Televisão. Duas bombas caíram e não explodiu. Uma obstruiu a passagem ao antigo prédio da Cinemateca, onde ficara depositada a cópia e o negativo. A fundação Cultural a prestação de contas que não fechava sem a cópia do filme, a situação no Núcleo era insuportável.

Apesar da pressão, tanto o presidente da Fundação André Freire, a Diretora Cultural Beth Brait, o Conselho Deliberativo, a Comissão Municipal de Cinema e Vídeo e do apoio dos membros do Núcleo, principalmente Meire Pedroso, que empreendeu o projeto do filme, todos, irmanados, conseguimos a bom termo, amainar a pressão da burocracia interna da Fundação Cultural Cassiano Ricardo, que cumpria seu papel.

Um ano depois, vou até o aeroporto de Cumbica, receber através de uma portadora, a cópia do filme em 35mm, que finalmente, técnicos conseguiram desativar as bombas caídas no prédio da cinemateca de Belgrado, liberando a passagem.

No filme, sobe à bandeira brasileira em formato de uma enorme pipa, em substituição as imagens que nossa equipe deveria ter captadas em Alcântara no Maranhão, quando do lançamento do Satélite, VL – 180, em seu lugar, a pipa. A base de lançamento do satélite, fabricada no Centro Tecnológico Aeroespacial - CTA - serve também para lançar outros... Objetos de alta destruição. No Brasil, se fabrica satélites e bases de lançamentos, mas, lançam-se pipas ao ar.

O filme será exibido dia 21.04 às 13h e Dia 28.04,às 17hs. No mesmo dia 28.04, às 19hs, haverá debate com o Zoran e o Curador da Mostra. Este seria um dia legal para nos encontramos.

Abs,
Diogo Gomes dos Santos

Nenhum comentário: